
COMPUTADOR : UMA MÍDIA DE MASSA
O primeiro computador surgiu nos anos 40, o Eniac, e pesava várias toneladas. Era preciso um prédio inteiro para abrigá-lo, e para programá-lo era necessário conectar seus circuitos através de cabos. Os anos 50 trouxeram a novidade da programação em código binário através de fitas e cartões perfurados. Desde então, por acréscimo, ou melhor, por justaposição evolutiva, o computador foi incorporando as evoluções tecnológicas, mudando seu formato, transformando o que era periférico, como o monitor e o teclado, em parte integrante da máquina e tornando seu lado "binário", seus fios e conectores, cada vez mais distantes do olhar do homem, que deixou de ser o programador para se tornar o usuário de uma nova tecnologia da inteligência.Foi a invenção do computador pessoal que transformou a informática em um meio de comunicação de massa. As variáveis de massa, volume e preço atingiram o patamar suficiente para tormar o computador uma mídia massiva. Não somente o tamanho e o custo da máquina foi decisivo para essa mudança. O desenvolvimento de softwares cada vez mais avançados, possibilitou uma interação mais "amigável" entre o usuário e o computador. No princípio, a utilização de uma linguagem abstrata de códigos dificultava o acesso, pois exigia um conhecimento prévio de linguagens de programação. A criação de "máscaras" para os sistemas operacionais, com símbolos que facilitavam o conhecimento e a memorização de procedimentos, antes complicados, tornou o computador acessível ao usuário comum. Além disso, a preocupação em manter um padrão simbólico para os procedimentos nos programas que foram substituindo os anteriores deu ao usuário a sensação de comodidade e potência frente às novidades.
A preocupação passou a ser a de tornar a interface com o usuário cada vez mais simples e amigável. A utilização do mouse, a incorporação do som, a sofisticação dos mecanismos de imagem e a utilização de softwares mais interativos vem tornando a máquina cada vez mais "suave". A materialidade do hardware foi se escondendo atrás das interfaces, e hoje é inimaginável supor que o computador se restringe ao processamento de um código binário.
Todas essas mudanças tornaram o computador parte da vida das pessoas. Ele passou a estar presente no escritório, em casa, nos locais de lazer e sua presença foi se tornando cotidiana. A princípio, ele era um facilitador de tarefas, um acessório.
A mudança definitiva para torná-lo uma mídia de massa aconteceu com a possibilidade de conexão dos microcomputadores em uma rede de comunicação. A Internet, inicialmente utilizada para fins militares e posteriormente incorporada pelo meio acadêmico, extrapolou esses ambientes restritos e, em virtude dos avanços da informática e das telecomunicações, foi possível conectar os computadores entre si, através de placas modem, e formar uma rede de comunicação de amplitude crescente, e que surge como grande novidade neste final de século.
INTERNET
A Internet é um veículo de informação que apresenta três características básicas: a interatividade, a instanteneidade e a possibilidade de acesso múltiplo à informação. Todas essas características têm como base as variáveis velocidade e forma reticular que serão os elementos estruturadores dessa mídia.
Rede de descobertas
Na Internet, as informações não estão ligadas linearmente, mas dispostas em trilhas transversais cujos nós de interseção acabam por criar uma geometria que se assemelha a uma rede. Uma vez estabelecida uma conexão, cada vez que um item é visualizado, todos os outros que estão ligados a ele podem ser recuperados.
A disposição da informação em forma não-linear, através de encaixes múltiplos com a utilização de interfaces padronizadas que possibilitam um exame rápido do conteúdo, com seleção de informações de interesse e conexões múltiplas a outras informações, não é característica exclusiva da Internet. Os jornais, revistas e outros meios de comunicação já trabalham isto através das manchetes, dos textos de chamada da primeira página, da númeração das páginas , da divisão dos cadernos por assunto específico, dentre outros artifícios.
Esses mecanismos permitem uma atenção flutuante, ou de interesse potencial pela informação. Ao deparar com a primeira página de um jornal, o leitor "passa os olhos " pelas manchetes, seleciona o assunto e através de mecanismos padronizados de busca, "acessa" a informação de seu interesse, sem necessariamente ter de examinar todo o conteúdo do jornal.
A diferença fundamental entre um jornal e a Internet está no fato de o jornal se apresentar como um open field (campo aberto), ou seja, todo seu conteúdo está à disposição, delimitado no tempo e no espaço. A Internet, por utilizar como suporte o computador, possui uma interface fechada, como destaca Pierre Lévy (1993): "a interface informática nos coloca diante de um pacote terrivelmente redobrado, com pouquíssima superfície que seja diretamente acessível em um mesmo instante. A manipulação deve então substituir o sobrevôo".
Ao contrário da maior parte dos sistemas de indexação e organização de dados, as informações a serem manipuladas na Internet não estão dispostas através da ordenação puramente hierárquica, mas através de associações.
Além disso, o suporte informático permite o gerenciamento de um volume de informações infinitamente superior, apesar de condicionado às limitações técnicas que vêm, entretanto, se tornando cada vez menores com o avanço tecnológico. Portanto, além de não se ter acesso ao contéudo total de informações presentes na Internet, o seu tamanho não é conhecido e nem delimitável.
Frente a esse espaço cuja linha do horizonte está muito próxima, e onde se sabe que há muito o que conhecer além dessas fronteiras visíveis, a atitude do sujeito é exploratória, de descobrimento. Talvez seja esta a explicação para o fascínio que a Internet exerce sobre o homem, por aguçar o lado infantil da curiosidade e a pulsão básica do ser humano de querer saber mais. O usuário passa a ser o descobridor de novos espaços virtuais, o navegador que parte em caravelas virtuais rumo a mundos desconhecidos, clica seu mouse em fundos falsos e demarca seu território. O termo navegar não é utilizado por acaso; ele é a metáfora de todo um comportamento determinado pela estrutura da Internet, de conhecimento e ação do sujeito sobre um contexto a ser descoberto.
A rede "on line"
A existência de um meio de comunicação de massa, que estruturalmente possui uma interface fechada e trabalha com um grande volume de informações dispostas em rede e acessíveis por associação, somente é possível pela velocidade introduzida pelos recursos informáticos. A passagem quase instantânea de um nó ao outro viabiliza a estrutura em rede da Internet e, como destaca Lévy, permite "generalizar e utilizar em toda sua extensão o princípio de não-linearidade. Isto se torna a norma, um novo sistema de escrita, uma metamorfose da leitura, batizada de navegação".
Se os meios de comunicação de massa tradicionais utilizam recursos para permitir uma leitura não-linear, com sistemas de indexação que operam com o princípio de hierarquia dos fatos a fim de facilitar a leitura ou o acesso à informação, na Internet a não-linearidade, não é recurso, mas a própria condição de sua existência. A informação diretamente acessível, "on line". Através de associações diversas, é possível chegar por caminhos distintos a uma mesma informação que pode, portanto, se ligar a contextos diversos, dependendo da ação do sujeito. Torna-se mais difícil determinar o caminho de leitura, como acontece com os mecanismos de indexação por hierarquização e interface aberta.
Acção e Construção
A maior liberdade de "trânsito" que a estrutura em rede de associações confere ao usuário da Internet dá a ele a capacidade de moldar o contexto da informação e, portanto, o próprio sentido desta. Não havendo um espaço universal homogêneo, a rede de nós que interligam as informações através de caminhos múltiplos na Internet não está no espaço, ela é o espaço. Isso quer dizer que a rede de informações não é fixa, mas deve ser moldada, construída e reconstruída pelo sujeito. Para existir como mídia, a Internet pressupõe a ação do sujeito.
O fato de não existir nesta enorme teia instâncias delimitáveis de emissão e recepção desloca o enfoque do efeito para o processo. Por isso foge da característica dos outros meios de comunicação de massa tradicionais, cuja estrutura e funcionamento acabam por colocar os pólos determinantes da comunicação em patamares diferentes (emissor x receptor), em uma relação não-dialógica. Estes pólos não emitem e recebem em perfeita igualdade de condições, apesar dos mecanismos de feedback e de acesso alternativo como cartas de leitores, serviços de atendimentos, entre outros.
Os meios de comunicação de massa tradicionais baseam sua estrutura no paradigma clássico da comunicação, emissor - canal - receptor, concedendo poderes consideráveis ao emissor e ao meio. A possibilidade de intervenção do usuário da mídia é mínima e se há ação modificadora do sujeito sobre o conteúdo veiculado, ela acontece por canais alternativos ao meio de comunicação.
Na Internet, o esquema estaria mais próximo do "A modifica uma configuração que é comum a A, B, C, D, etc" (Lévy, 1993). Essa intervenção não significa, necessariamente, modificação de uma determinada informação, mas a composição de um contexto, a partir da ativação de uma determinada parte da rede, possibilitada pela estrutura hipertextual da Internet e potencializada pela velocidade de acesso aos inúmeros links disponíveis. A ênfase passa a ser dada ao contexto, considerado como algo mutável. A interatividade entre os diversos elementos do processo comunicativo é a condição para a manutenção e desenvolvimento do meio.
Portanto, na Internet a ênfase no processo comunicativo é dada aos sujeitos que a utilizam. O meio não é mais o personagem a parte que traduz o mundo objetivo para um receptor passivo. Ele deixa de ser a ferramenta de transmissão de informação para se tornar o ambiente da informação.
A rede da fala
A interatividade proporcionada pela estrutura da Internet torna a comunicação mais próxima dos esquemas comunicativos mais primitivos, chegando a simular a situação face a face, com os mecanismos de presença virtual. Isto se tornou possível pela interpenetração progressiva entre o meio (técnica) e o instrumento mais básico da comunicação humana: a linguagem. Com a evolução das tecnologias, essas passaram a se moldar às regras, à estrutura e ao modo de funcionamento do mundo da linguagem. A Internet é um exemplo dessa evolução. A constituição do meio sob a forma de um sistema reticular, à imagem do sistema da língua, composto por circuitos, nós de conexão e automatismos, possibilitou um mundo cada vez mais à imagem do mundo da linguagem natural, tanto na sua estrutura como no seu funcionamento. O meio vai sendo naturalizado e incorporado pelo usuário, deixando de lhe aparecer na estranheza do assessório.
A Internet, portanto, muito além de ser um novo meio meio de comunicação de massa, surge como um meio comunicativo revolucionário em toda sua concepção e estrutura, capaz de mudar muitas das regras de interação já estabelecidas.