Texto I - O dilema de Henrique
Numa cidade da Europa, uma mulher estava quase a morrer com um tipo muito raro de cancro. Havia um remédio, feito à base de Rádio, que os médicos imaginavam que poderia salvá-la, e que um farmacêutico da mesma cidade havia descoberto recentemente. A produção do remédio era cara, mas o farmacêutico cobrava por ele dez vezes mais do que lhe custava produzi-lo: O farmacêutico pagou €400 pelo Rádio e cobrava €4000 por uma pequena dose do remédio. Henrique, o marido da enferma, procurou todos os seus conhecidos para lhes pedir dinheiro emprestado, e tentou todos os meios legais para consegui-lo, mas só pôde obter uns €2000, que é justamente a metade do que custava o medicamento. Henrique disse ao farmacêutico que a sua mulher estava a morrer e pediu-lhe que vendesse o remédio mais barato, ou que o deixasse pagar a prestações. Mas o farmacêutico respondeu: ‘Não, eu descobri o remédio e vou ganhar dinheiro com ele’. Assim, tendo tentado obter o medicamento por todos os meios legais, Henrique, desesperado, considera a hipótese de assaltar a farmácia para roubar o medicamento para sua esposa. O Henrique deve roubar o medicamento?”
Kholberg
Resposta à questão:
Não! O farmacêutico tem todo o direito de defender o seu produto. Mas a questão é que o Henrique vai ter que assaltar a farmácia, porque está em estado de necessidade,o que faz com que a culpa dele seja diminuída, a Lei para estes casos tem atenuantes, o Henrique não vai sofrer uma pena mas uma punição o que é diferente.
JUSTIFICAÇÃO e PROBLEMATIZAÇÃO da RESPOSTA
" não deve roubar mas tem de furtar "
1. Critica-se em primeiro lugar, a impossibilidade de dar respostas que não sejam preto ou branco. Uma área tão controversa como a moralidade, os deveres e obrigações humanas, especialmente quando envolve um crime, não pode exigir respostas rígidas e absolutas como "sim" ou "não". A vida é mais complexa do que a simplicidade de uma resposta que ou aceite ou negue uma determinada afirmação. Em debate e discussão todas as opiniões devem ser respeitadas desde que justificadas e fundamentadas.
2. Na resposta dada foram tomadas em consideração o direito legítimo do farmacêutico porque age de acordo com a lei e a exigência superior do Henrique que se debate com uma situação de vida ou morte da esposa.
3. A resposta dada leva sempre em consideração o interesse superior da vida sobre o direito de propriedade.
4. A parte da resposta "não deve roubar" significa apenas que o Henrique vai sempre cometer um crime, vai sempre ofender um direito legítimo que a lei tem de proteger. "Não deve roubar" significa que a decisão do que é crime não pode nunca caber a opiniões pessoais e subjectivas de cada um de nós. Porque senão onde está o limite? Quem define quando posso roubar? O que é um interesse superior? Até que ponto eu posso exigir que outras pessoas alheias ao meu problema se sacrifiquem por mim? "Não deve roubar" significa que não pode ser oferecido ao Henrique o poder de cometer crimes de acordo com a sua necessidade e vontade. " Não deve roubar" dirige-se a todos nós, à sociedade em geral para que a ordem social não se transforme em insegurança e na lei do mais forte.
5. A parte da resposta "mas tem de furtar" significa apenas que na situação concreta Henrique está numa situação que não pode exigir outro comportamento porque a vida de uma pessoa é sempre o valor mais importante. "Mas tem de furtar" significa apenas que o Henrique não tem a liberdade de escolha, ele está "obrigado" pela moral humana a proteger a vida da esposa que sem aquele crime se vai perder irremediavelmente. "Mas tem de furtar" significa que Henrique não pode nunca ter o mesmo grau de culpa de quem comete um roubo porque ele está num dilema moral. "Mas tem de furtar" significa que apesar da obrigação de todos nós de respeitar a propriedade dos outros pode haver situações em que se sacrifique esse mesmo direito para proteger outro superior. "Mas tem de furtar" significa que a decisão de saber se Henrique age mal ou bem se tem de definir objectivamente, por critérios que não sejam simplesmente sujeitos ao arbítrio de cada um.
6. "Não deve mas tem de furtar" significa que foi cometido um crime mas Henrique não tem culpa na ofensa desse direito de propriedade. Dizer que "ele pode" significava que todos nós podemos decidir quando, como e a quem podemos cometer um crime. Dizer "não pode" significava que a lei não aceita situações extremas de necessidade e em que somos moralmente obrigados a agir para defender bens superiores.
7. Não deve mas tem de furtar contém uma regra geral para todos nós e uma excepção para determinadas situações concretas e sujeitas a determinadas condições objectivas.
8. Porque não pode ser aceite esta opinião? Estará esta opinião tão mal fundamentada ou sem qualquer razão? Sim ou não?, ou talvez?